terça-feira, 7 de julho de 2015

Ghent - Uma cidade de chocolate

A cidade de Ghent, ou Gante (em função do idioma escolhido), é um exemplo extraordinário da arquitetura da antiga Flandres, atualmente a parte flamenga da Bélgica. Fica a pouco mais de 50 km a Oeste de Bruxelas mas, apesar de estar tão próxima da capital, a cidade não é a preferida de quem visita este país. Na verdade, a maioria dos turistas quase a ignoram, passando ao lado a caminho de Bruges, e nem imaginam o erro que estão a cometer.

Trata-se de uma cidade fantástica, verdadeiramente monumental, com um centro histórico que concentra várias igrejas imponentes e até um castelo, e que é atravessado por um único canal, que lhe dá uma configuração muito peculiar, como que uma personalidade que a diferencia de qualquer outra cidade, na Bélgica ou mesmo no resto da Europa.

Gent é a capital da província da Flandres Oriental e chegou a ser uma das cidades mais ricas e prósperas do Norte da Europa. Hoje é a terceira cidade da Bélgica, não é muito grande, mas é bastante interessante, sobretudo porque o seu esplendor arquitetónico se mantém ainda bem preservado. Além disso, é um local bem alegre e movimentado e sempre frequentado por jovens, por ser uma das mais importantes cidades universitárias belgas. 

O centro histórico não é muito grande e pode-se perfeitamente caminhar passando pelos pontos de interesse essenciais, atravessando as principais ruas e praças, e deambulando por entre monumentos e edifícios que parecem ter saído de contos de fadas. O percurso obrigatório passa pelos principais monumentos e leva-nos necessariamente à rua Sint-Michielspleis, onde é possível observar o alinhamento das três principais torres da cidade, razão pela qual lhe é dado o nome de "cidade das três torres". A primeira das torres é da Igreja de St. Nicholas, a torre seguinte é o campanário ou Belford da cidade, a maior das três, com os seus 90m de altura e, no final da rua, surge a Catedral de St. Bavo, em torno da qual terá nascido a cidade, e de onde se ergue a terceira torre.

Mas Gent é também a cidade do chocolate, o que se nota pelo aroma a cacau que se sente nas ruas e praças, onde somos brindados pela presença de chocolateries que são autênticas preciosidades, com montras de aspeto requintado e delicioso, fazendo parte da decoração, não só de cada loja, mas da própria cidade. 

Escolhemos uma das muitas chocolatarias próximas das margens do canal, a Chocolaterie Cédric Van Hoorebeke, e comprámos algumas obras de arte da chocolataria belga. Os belgas orgulham-se de produzir alguns dos melhores chocolates do mundo. Normalmente são pequenos bombons com recheios delicados e coberturas do mais fino chocolate. As lojas de chocolate são também, elas próprias, dignas de uma visita, pelo modo como expõem os bombons em vitrinas de forma quase preciosa, como se fossem jóias e estivéssemos numa ourivesaria. 

Selecionámos alguns exemplares, entre pralinés, gianduias, ganaches e outras pérolas. Escolhemos depois a esplanada de uma cervejaria, ainda junto ao canal, onde pudemos experimentar algumas das cervejas artesanais produzidas na Bélgica, com que acompanhámos os bombons que tínhamos acabado de comprar. Talvez não seja um hábito da gastronomia belga, mas está mesmo a pedir que se juntem estas duas especialidades locais, acompanhando chocolates com cerveja . . . a mim faz-me todo o sentido e é mesmo uma combinação deliciosa . . . quem não acreditar que experimente. 

E enquanto degustávamos as mais preciosas iguarias belgas, éramos envolvidos por uma paisagem lindíssima da zona do canal . . . como um porto medieval que em tempos serviu como um dos principais polos de comércio para os mercadores do Norte da Europa.

E a visão daqueles edifícios, grandiosos e encantadores, sobre as águas calmas do canal, dá-nos a ilusão de estarmos no mundo encantado dos contos de fadas. E, neste caso, as semelhanças levam-nos a um universo inspirado na casa de chocolate e guloseimas de Gretel & Hansel, levando-nos a fingir que podemos estar mesmo numa cidade encantada, uma verdadeira cidade de chocolate. 

Carlos Prestes
Julho de 2015 

domingo, 5 de julho de 2015

Uma Holanda imaginada

Quando imaginamos a Holanda como um país cheio de moinhos por toda a parte, estamos completamente enganados, não é nada assim.

Mas se procurarmos bem e fizermos a pesquisa necessária, acabamos mesmo por encontrar essa imagem do estereotipo holandês . . . uma zona rural recortada por longos canais e dezenas de moinhos junto às margens. Uma imagem sonhada que se tornou realidade quando encontrámos a aldeia de Kinderdijk, a escassos 20 km da cidade de Roterdão. 

Kinderdijk é conhecida por ser o local com a maior concentração de moinhos em toda a Holanda, o que lhe valeu o título de Património Mundial da UNESCO, ao juntar um conjunto de 19 moinhos de vento, ainda em muito bom estado, apesar de serem do longínquo século XVIII. 

Neste local não é permitido o acesso a automóveis ou motos, pelo que somos convidados a caminhar ao longo das margens do canal principal, ou a usar uma das bicicletas que lá se podem alugar. Podemos ainda passear nuns barcos que percorrem os canais fazendo sucessivas paragens. E podemos também visitar um museu sobre a história do local e um dos moinhos, que se encontra aberto a visitas turísticas. 

Assim, escolhemos fazer uma caminhada demorada pelas margens do maior canal, apreciando a beleza daquele sítio e chegando perto de alguns dos moinhos mais próximos. E, mais tarde, entrámos ainda num dos barcos e deixámos que nos levasse num passeio pelos canais mais distantes, para conseguirmos uma panorâmica mais global. 

A função destes moinhos de vento era bombar as águas dos canais para um reservatório com o objetivo de manter os níveis e evitar as cheias que sempre assolavam a Holanda. Estes moinhos funcionaram desde o século XVIII até 1927, quando foram substituídos por um conjunto de bombas. No entanto, na Segunda Guerra Mundial, com a dificuldade em conseguir combustível para alimentar essas bombas, os moinhos voltaram a funcionar, tendo então sido utilizados até aos anos 50. 

Mas o local está cheio de histórias, sobretudo anteriores à instalação dos moinhos que aqui vemos, quando a população estava à mercê dos caprichos da natureza. E a última grande cheia registada neste local é também uma história de encantar, que está na origem do próprio nome da aldeia. Segundo a lenda, em 1421, durante a maior das cheias de que havia memória, um berço com uma criança foi mantido em equilíbrio por um gato, que a encaminhou sobre as águas até à encosta de um dique, tendo assim sido salva. E é essa a razão pela qual este local foi batizado como kinderdijk - kinder, que quer dizer criança e dijk, que significa dique. 

As despedidas dos locais mais encantadores, como este, são sempre difíceis. Fica-nos, muitas vezes, uma sensação de perda. Por isso tentámos prolongar os últimos momentos, apreciando aquele ambiente bucólico de paisagens encantadas, um autêntico cartão-postal de uma Holanda imaginada.

Carlos Prestes 
Julho de 2015