segunda-feira, 23 de maio de 2005

Lago de Como


A cerca de 50 km, quer da cidade de Milão quer do Aeroporto de Milão-Malpensa, fica a cidade de Como, banhada por um dos Lagos mais glamorosos de toda a Europa, o Lago di Como.

Trata-se do terceiro maior lago de Itália, depois dos lagos de Garda e Maggiore. A sua origem resulta da água dos degelos de glaciares nos Alpes, que se acumula neste vale cavado entre montanhas ingremes, com extensas florestas e com dezenas de pequenas aldeias e vilas históricas. É também um dos lagos mais profundos da Europa, atingindo mais de 400m de profundidade.

O lago proporciona um cenário absolutamente deslumbrante, pelos tons de azul forte das águas, que vão variando em função das profundidades, e pelos verdes intensos dos bosques, pontilhados pelas casas que se dispõem desde o alto das encostas até às margens do lago, onde sobressaem algumas mansões de luxo, que aqui são chamadas de villas, normalmente com jardins majestosos sobre o lago, e que fazem as delícias dos milionários de todo o mundo.

A visita ao lago, para quem não tenha uma villa luxuosa e nem sequer se consiga alojar num dos hotéis de charme próximos das margens, pode ser feita de duas formas: ou de carro, ao longo da estrada sinuosa que contorna toda a margem do lago, ou então de barco, seguindo um dos passeios coletivos, ou mesmo alugando um barco… em função do valor que se queira gastar.

Recomendo uma combinação destas duas alternativas, com um percurso de alguns quilómetros ao longo do lado Oeste do lago, parando sempre que possível nos pontos mais interessantes… fazendo-se depois um passeio de barco que permita contemplar a paisagem de um outro ângulo.

Em qualquer dos trajetos não deixamos de ser surpreendidos por belas paisagens e por uma envolvente fantástica. Desde o ambiente bucólico junto ao espelho de água, com as casas luxosas na primeira linha, até às montanhas íngremes e verdejantes, dos bosques viçosos que as ocupam, e onde surgem as aldeias pitorescas que se dispõem ao longo do vale.

No trajeto da subida do lago, numa estrada de curvas e contracurvas, e com imensa dificuldade para estacionar junto aos pontos mais apelativos, lá fomos conseguindo fazer algumas paragens, mas quase sempre algo longe dos locais a visitar, o que nos obrigava a pequenas caminhadas, mas que se tornaram ainda mais apetecíveis por nos revelarem recantos escondidos com paisagens deslumbrantes.

Na viagem de barco vão-nos revelando alguns das imagens mais preciosas e que não conseguimos observar no percurso de carro, tornando-se visível toda a linha de costa, à beira do espelho de água, onde se encontram as famosas villas de alto luxo, autênticos palacetes com jardins radiosos, onde se imaginam festas para celebridades e convidados de muitos milhões de euros.

Uma das mansões mais procuradas deste local é a Villa Oleandra, que só pode ser observada a partir do lago, e que, aparentemente, é apenas mais uma villa luxuosa, com um imenso jardim desde a casa até ao ancoradouro privativo. Mas esta tornou-se particularmente especial quando foi adquirida por George Clooney em 2002, pela quantia simpática de sete milhões de dólares, tornando-se assim no local ideal, para quem esteja convidado, ir até lá tomar um Nespresso, what else?... estranhamente não foi o nosso caso!

Mas naquele dia em particular, com a nossa presença, estes lugares nas margens do lago revelaram imagens que foram ainda mais especiais e absolutamente encantadoras… e não acredito que possam existir fotos mais belas em todo um vasto portfolio de fotografias do Lago di Como.

Carlos Prestes

sábado, 21 de maio de 2005

A torre inclinada de Pisa


A Norte da região da Toscana encontramos um dos destinos imperdíveis de Itália, não porque seja um lugar fascinante e que nos apaixone, mas apenas por ser um daqueles locais que toda a gente tem que visitar uma vez na vida… e este local é Pisa, ou melhor, a torre de Pisa… porque é só o que visitamos nesta cidade toscana, um imenso relvado, a Piazza dei Miracoli, com a Catedral de Santa Maria da Assunção, o Duomo da cidade e, claro, com o seu campanário, uma torre inclinada que todos conhecem como Torre de Pisa

Depois de percorrermos a Toscana fica-nos a ideia de que já vimos tanto, que esta torre já não acrescentaria grande coisa… mas há o pormenor desta ter sido mal construída ou não ter sido devidamente acautelado o comportamento dos seus solos de fundação. Um erro, de cálculo ou de execução, que fez desta construção deficiente uma das torres mais famosas do mundo.

Depois houve uma intervenção providencial que fez com que a torre não tivesse caído nem tivesse sido recolocada na vertical, ficou exatamente com tinha de ficar, estável mas inclinada, para assim continuar a receber os milhões de turistas que a visitam.

E, por isso, lá vamos todos em romaria visitar a torre… muitos japoneses, claro há japoneses por todo o lado… mas nós também lá vamos. E todos nós, tal como os japoneses, tiramos a fotografia da praxe (de que vos vou poupar nesta publicação) com a mão a amparar o vazio, para que na foto dê a ilusão de que é a pessoa fotografada que está a impedir que a torre caia.

Passámos algum tempo no relvado em torno do Duomo e da torre, mas não há magia… assume-se o chip de quem está num parque de diversões e, no final, quase que acabamos por ficar com os olhos em bico.

Será uma visita imperdível?... sim, talvez seja, acho que se justifica o desvio para fazer uma visita rápida, mas só uma única vez na vida para ver como é que é esta torre que quer desafiar as leis da gravidade… e fica visto!

Carlos Prestes

sexta-feira, 20 de maio de 2005

Piazzale Michelangelo – Firenze


Ao terceiro dia na Toscana chegámos finalmente a Florença, a grande cidade da região e um dos principais centros culturais e artísticos de Itália, considerada como a capital do Renascimento.

Para além dos habituais percursos pela cidade, que são naturalmente recomendáveis, existe um único lugar imperdível na cidade de Florença: a Piazzale Michelangelo… uma praça em forma de balcão que se ergue no alto da colina ao Sul do centro histórico, e que funciona como um dos miradouros mais extraordinários em que já estive.

Na subida até alcançamos o miradouro não imaginamos que vamos encontrar uma vista tão compensadora, mas quando chegamos, abre-se à nossa frente a imagem do próprio Renascimento, um autêntico museu vivo com algumas das preciosidades da história de arte mundial… a paisagem, ainda com os traços medievais, das margens do rio Arno, com a magnífica Ponte Vecchio - o Palazzo Vecchio, mais uma construção medieval, com a imensa Torre de Arnolfo - ou o Duomo de Santa Maria del Fiore, a Catedral da cidade, com a sua cúpula majestosa, com sinais da preciosidade arquitetónica do Renascimento.

Tudo isto surge ao nosso alcance numa única imagem como quem mergulha num extraordinário cartão postal.

Mas não basta visitar este magnífico miradouro uma única vez, é também imprescindível voltar lá durante a noite. Depois do pôr-do-sol as cidades adquirem uma outra face, como se fossem lugares diferentes, mais intimistas e mais acolhedoras, sem a amálgama impessoal dos muitos turistas que as afogam durante o dia.

E é assim, quase em estado natural, que encontramos a cidade de Florença quando a contemplamos durante a noite da Piazzale Michelangelo, a mesma beleza monumental, mas agora sem o ruido e a azáfama habituais de todos os dias, revelando uma pureza que é quase arrepiante.


Florença só é a cidade que é porque pode ser contemplada da Piazzale Michelangelo, de uma forma tão poética, que é como um fresco de um dos seus grandes mestres.

quinta-feira, 19 de maio de 2005

A cidade das torres - San Gimignano


Em plena província da Toscana surge-nos San Gimignano, uma pequena cidade entre muralhas que é também um dos polos turísticos mais concorridos desta região.

O local está organizado para acolher os visitantes, há que estacionar num parque municipal e apanhar um minibus até às portas da cidade. Funciona bem, mas faz-nos logo antever que se trata de um sítio demasiadamente turístico, nada parecido com os locais tranquilos que encontramos ao longo da Toscana… mas a silhueta da cidade vista de fora faz-nos acreditar que se trata de um lugar muito especial.

Quando atravessamos os portões das muralhas confirmamos a presença de um mar de gente, de italianos a vários europeus, de americanos a japoneses, vão enchendo as ruas e praças empedradas de uma cidade que mais nos parece uma aldeia medieval, como tantas outras na Toscana, mas esta com uma marca arquitetónica bem distinta, que lhe é dada pelo conjunto de torres que se erguem em cada recanto da cidade e que são o seu ex-libris.

Atualmente existem 14 torres, mas alguns historiadores vêm referindo que, na idade-média, terão existido um total de 72. De qualquer forma, tanto no passado como na atualidade, San Gimignano é definitivamente a cidade das torres.

As maiores são a torre de La Rognosa, com cerca de 50m de altura, que é também a mais antiga da cidade e que era utilizada como prisão e a Torre Grossa, com 54m, localizada na Piazza Duomo, ao lado do Palazzo Nuovo del Podestà.

A visita à cidade torna-se algo cansativa, como sempre acontece em locais muito concorridos, numa autêntica romaria que nos faz percorrer os empedrados que ligam cada uma das praças, onde se erguem cada uma das suas torres, passando pelos locais principais, como a Piazza Duomo, o centro político e religioso da cidade ou a Piazza della Cisterna, com o seu poço, que é o principal ponto de encontro de turistas, que costumam atirar moedas, como na Fontana di Trevi, em Roma.

Depois disso, e para desanuviar um pouco da confusão, resolvemos fugir da multidão, saindo da cidade a pé, até nos afastarmos algumas centenas de metros num passeio tranquilo, entrando de novo na Toscana mais rural, e deixando atrás uma imagem genuína desta cidade, com a sua silhueta marcada pelas 14 torres medievais, que fazem de San Gimignano a mais bela cidade das torres de que tenho memória.

Carlos Prestes

quarta-feira, 18 de maio de 2005

Uma Toscana mais profunda


Quando percorremos a região da Toscana optámos pelas estradas secundárias que nos levaram entre paisagens rurais, intercaladas por aldeias de influência etrusca, num ambiente de um imaginário quase medieval . . . quisemos sempre ir parando vezes sem conta com o pretexto de mais uma foto, mas ficando cada vez mais tempo em cada paragem, para apreciar convenientemente aquele ambiente inspirador que nos ia envolvendo.

Fomos seguindo ao longo de extensos campos verdejantes, por vezes pontilhados pelos enormes rolos de feno seco, e encontrámos sempre as vinhas, imensos campos de vinha, quase sem fim, que são a imagem de marca desta região de Itália, sobretudo nas chamadas terras de Chianti, onde se produz o afamado vinho com o mesmo nome.

É esta a paisagem típica da Toscana, uma encosta com extensos campos de vinha e, ao longe, uma casa senhorial, quase sempre assinalada pelas linhas de ciprestes ao longo dos caminhos de acesso.

Mas para além desta beleza mais comum, por vezes entramos numa Toscana mais profunda, sem o estereotipo das vinhas, ainda com campos cultivados, mas marcados pelos traços de outras culturas, como esta colina avermelhada da argila lavrada, em contraste com o amarelo-torrado das plantações de cereais já maduros, com uma beleza sublime que nos surgiu de forma surpreendente numa das estradas percorridas.

A paisagem é diferente, mas mantêm-se os traços que nos fazem sentir o ambiente da Toscana... onde toda a contemplação é marcada por um silêncio celestial que nos atordoa, e pelo poder dos aromas, da terra, das plantas, dos campos cultivados, cheiros que se tornam ainda mais intensos e marcantes num final de tarde de Primavera, como este.

Carlos Prestes
 

segunda-feira, 16 de maio de 2005

La piazza del Palio - Siena


Entrar em Siena é viajar no tempo até à idade média. Segundo os registos históricos, a atual cidade, que é o principal centro urbano da zona sul da Toscana, mantém ainda um aspeto semelhante ao dos séculos XIII e XIV. 

E essa preservação do aspeto medieval, mantendo a arquitetura original devidamente reabilitada e conferindo à cidade uma beleza singular, é também o principal atrativo que leva a este centro da Toscana dezenas de milhares de turistas todos os anos... mas esse é sempre o grande problema das mais bonitas cidades italianas.

Uma das principais atrações locais é a catedral, Il Duomo di Siena. Construída entre os séculos XII e XIII, é um exemplo típico da arquitetura gótica italiana, com uma fachada majestosa e um interior com enorme riqueza patrimonial. É feita em mármore de Carrara com tonalidades contrastantes, ostenta pavimentos artísticos em mosaico, afrescos nos tetos e nas abóbadas e várias esculturas dos mais conceituados artistas da época. 

Mas o que realmente me entusiasmou na visita ao interior desta catedral foi a possibilidade de subir até ao alto da sua torre e contemplar daí toda a cidade, as suas ruas e praças, os telhados dos seus edifícios, numa paisagem onde a presença nefasta dos turistas se dissipa, o burburinho que eles provocam desaparece e ficamos ali, deslumbrados, a olhar em volta, com a certeza de que viajámos mesmo no tempo a caminho da idade média. E da vasta panorâmica que se observa lá do alto, destacava-se o mais importante local de Siena, a Piazza del Campo, com o seu símbolo maior, a imponente a Torre del Mangia, que é como um posto de vigia que protege toda a cidade.
Em qualquer caminhada pelas ruas de Siena, entre lojas, restaurantes ou gelatarias, o destino será invariavelmente o mesmo, a Piazza del Campo, para onde todos os caminhos convergem. Por isso, acabámos naturalmente por lá chegar e por lá nos deixámos ficar, até que a noite caísse e os turistas começassem a abandonar o local. É essa a altura em que a praça mais nos cativa, quando a cidade se torna genuína e conseguimos observar um palpitar diferente, mais inspirador.

Pelas ruas da cidade é comum encontrar bandeiras e faixas coloridas com os brasões de cada bairro ou “contrade” (que é como se designam os bairros de Siena), o que acentua ainda mais o ambiente ancestral envolvente e aquele imaginário que associamos aos torneios medievais, talvez por força de tantos filmes de época a que assistimos. 

Esse hábito de engalanar as ruas de cada bairro está ligado ao evento maior da cidade, o Palio di Siena, a famosa e emocionante corrida de cavalos, num regresso quase literal à idade média. O Palio é feito duas vezes por ano na Piazza del Campo, a 2 de julho e a 16 de agosto, desde o século XVII. Participam os 17 bairros da cidade (os tais contrades), cada um deles desfilando pela piazza com as suas cores, as suas bandeiras, o seu brasão e entoando o seu hino. Mas na corrida, propriamente dita, participam apenas 10 cavalos e cavaleiros, de cada um dos 10 bairros escolhidos por sorteio. Ganha o cavalo que chegar primeiro após três voltas ao redor da praça, mesmo que o jóquei já tenha caído e o cavalo chegue sozinho. A corrida dura apenas 90 segundos, mas a celebração do evento prolonga-se por várias semanas.

Na minha primeira visita à cidade de Siena coincidiu ter lá estado no dia 15 de agosto, ou seja, um dia antes do Palio (de que eu nem nunca tinha sequer ouvido falar). Por isso a cidade estava naturalmente diferente, com os habitantes locais em grande número e numa azáfama descomunal, as ruas enfeitadas com bandeiras e faixas, o que dava à cidade uma imagem ainda mais medieval. 


E é este mesmo local, por onde correram desenfreadamente cavalos e cavaleiros nas várias celebrações do Palio, durante séculos, que agora nos acolhe. E é por lá que permanecermos horas sem conta, a contemplar os traços de uma Idade Média tão presente, e a sentir o palpitar da atual cidade.  

E foi nessa mesma praça que haveria de me deleitar ao observar a imagem enternecedora da minha filha Martinha, ainda bebé, a ensaiar os seus primeiros movimentos para gatinhar, naquele empedrado quente e acolhedor e carregado de tantos anos de uma história, que marca a história desta cidade.           

Carlos Prestes


domingo, 15 de maio de 2005

Dolce fare niente - Toscana


Viajar por Itália traz-me sempre uma sensação muito agradável, como que um conforto de quem se sente em casa. Talvez pelas paisagens ou pelos hábitos locais, certamente pelas pessoas e por aquela língua cantada... mas também pelos paladares, pelos aromas e por todo um ambiente, que é tão cativante, e que se percebe em cada detalhe desta terra. 

É provavelmente o país que melhor nos conseguirá proporcionar aqueles prazeres que só em Portugal costumamos experimentar. E é na Toscana, a província rural mais encantadora de toda a Itália, que essas semelhanças se tornam mais evidentes. 

E é tão fácil deixarmo-nos envolver pelo gozo de uma vida prazenteira que tanto nos agrada. Do almoço prolongado à sombra de um alpendre que nos refresca do calor ardente. Da comida deliciosa, dos vinhos, dos queijos, dos sabores condimentados com ervas mediterrâneas. Do ecoar da música arrebatadora que se ouve em fundo, a ária de uma ópera italiana, que só ali me faz sentido. 

E há sempre o poder esmagador das imagens, cada ângulo abre-nos um novo cartão postal que nos deslumbra. Um horizonte de tons dourados de um campo de trigo maduro, salpicado por enormes rolos de feno seco, que ali repousam. O verde intenso de uma vinha infinita junto ao vermelho vivo dos campos de papoilas. Ou uma casa senhorial, la casa dei padroni, sempre marcada pela linha de ciprestes que assinala o carreiro de acesso. Ou até uma fortaleza medieval, com séculos de histórias de combates sangrentos na proteção da aldeia, e que repousa agora tranquila, do alto da sua colina. 
E é mesmo assim, quando descobrimos a Toscana, esse lugar tão mágico e acolhedor, apetece-nos ficar sempre mais um bocadinho, num dolce fare niente, para um último copo de Chianti com uma côdea estaladiça de pão molhado em azeite... e para um último olhar em volta, confirmando a imagem da perfeição. 

Carlos Prestes