segunda-feira, 16 de maio de 2005

La piazza del Palio - Siena


Entrar em Siena é viajar no tempo até à idade média. Segundo os registos históricos, a atual cidade, que é o principal centro urbano da zona sul da Toscana, mantém ainda um aspeto semelhante ao dos séculos XIII e XIV. 

E essa preservação do aspeto medieval, mantendo a arquitetura original devidamente reabilitada e conferindo à cidade uma beleza singular, é também o principal atrativo que leva a este centro da Toscana dezenas de milhares de turistas todos os anos... mas esse é sempre o grande problema das mais bonitas cidades italianas.

Uma das principais atrações locais é a catedral, Il Duomo di Siena. Construída entre os séculos XII e XIII, é um exemplo típico da arquitetura gótica italiana, com uma fachada majestosa e um interior com enorme riqueza patrimonial. É feita em mármore de Carrara com tonalidades contrastantes, ostenta pavimentos artísticos em mosaico, afrescos nos tetos e nas abóbadas e várias esculturas dos mais conceituados artistas da época. 

Mas o que realmente me entusiasmou na visita ao interior desta catedral foi a possibilidade de subir até ao alto da sua torre e contemplar daí toda a cidade, as suas ruas e praças, os telhados dos seus edifícios, numa paisagem onde a presença nefasta dos turistas se dissipa, o burburinho que eles provocam desaparece e ficamos ali, deslumbrados, a olhar em volta, com a certeza de que viajámos mesmo no tempo a caminho da idade média. E da vasta panorâmica que se observa lá do alto, destacava-se o mais importante local de Siena, a Piazza del Campo, com o seu símbolo maior, a imponente a Torre del Mangia, que é como um posto de vigia que protege toda a cidade.
Em qualquer caminhada pelas ruas de Siena, entre lojas, restaurantes ou gelatarias, o destino será invariavelmente o mesmo, a Piazza del Campo, para onde todos os caminhos convergem. Por isso, acabámos naturalmente por lá chegar e por lá nos deixámos ficar, até que a noite caísse e os turistas começassem a abandonar o local. É essa a altura em que a praça mais nos cativa, quando a cidade se torna genuína e conseguimos observar um palpitar diferente, mais inspirador.

Pelas ruas da cidade é comum encontrar bandeiras e faixas coloridas com os brasões de cada bairro ou “contrade” (que é como se designam os bairros de Siena), o que acentua ainda mais o ambiente ancestral envolvente e aquele imaginário que associamos aos torneios medievais, talvez por força de tantos filmes de época a que assistimos. 

Esse hábito de engalanar as ruas de cada bairro está ligado ao evento maior da cidade, o Palio di Siena, a famosa e emocionante corrida de cavalos, num regresso quase literal à idade média. O Palio é feito duas vezes por ano na Piazza del Campo, a 2 de julho e a 16 de agosto, desde o século XVII. Participam os 17 bairros da cidade (os tais contrades), cada um deles desfilando pela piazza com as suas cores, as suas bandeiras, o seu brasão e entoando o seu hino. Mas na corrida, propriamente dita, participam apenas 10 cavalos e cavaleiros, de cada um dos 10 bairros escolhidos por sorteio. Ganha o cavalo que chegar primeiro após três voltas ao redor da praça, mesmo que o jóquei já tenha caído e o cavalo chegue sozinho. A corrida dura apenas 90 segundos, mas a celebração do evento prolonga-se por várias semanas.

Na minha primeira visita à cidade de Siena coincidiu ter lá estado no dia 15 de agosto, ou seja, um dia antes do Palio (de que eu nem nunca tinha sequer ouvido falar). Por isso a cidade estava naturalmente diferente, com os habitantes locais em grande número e numa azáfama descomunal, as ruas enfeitadas com bandeiras e faixas, o que dava à cidade uma imagem ainda mais medieval. 


E é este mesmo local, por onde correram desenfreadamente cavalos e cavaleiros nas várias celebrações do Palio, durante séculos, que agora nos acolhe. E é por lá que permanecermos horas sem conta, a contemplar os traços de uma Idade Média tão presente, e a sentir o palpitar da atual cidade.  

E foi nessa mesma praça que haveria de me deleitar ao observar a imagem enternecedora da minha filha Martinha, ainda bebé, a ensaiar os seus primeiros movimentos para gatinhar, naquele empedrado quente e acolhedor e carregado de tantos anos de uma história, que marca a história desta cidade.           

Carlos Prestes


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